sábado, 20 de novembro de 2010

"Tanto Mar", uma saudação de Chico Buarque à Revolução dos Cravos

Constextualização Histórica

É abril, dia 25. O ano, 1974. Estudantes e militares tomam as ruas de Lisboa... É o fim da longo ditadura salazarista, ou de um facismo à portuguesa. Não se sabe ao certo o porquê da escolha do cravo como símbolo da revolução, mas isso pouco importa. Nesse dia, estudantes, mulheres e crianças ofereciam as rosas aos militares, que as colocavam nos canos de suas armas. Mas enquanto Portugal era sacudido pelo ideal revolucionário, o Brasil ainda vivia a ditaura militar, sob o comando do general Ernesto Geisel.

A composição original

A letra original de "Tanto Mar" foi censurada pelo governo brasileiro. Nela, Chico Buarque escreve no presente, mostrando que a ideia de revolução está acontecendo. Chico se refere à uma festa, a Revolução dos Cravos. No fim da música, Chico termina com alguém no Brasil pedindo urgentemente um pouco do cheiro do alecrim (especiaria e símbolo dos descobrimentos portugueses no Oriente) por exalar um aroma agradável, para ajudá-lo a respirar melhor na dificil situação que seu país se encontra. O governo brasileiro proibi a canção, com medo de que a mesma pudesse instigar um movimento revolucionário aqui, influenciado pelos ideais lusitanos.

Letra original:

Sei que está em festa, pá
Fico contente
E enquanto estou ausente
Guarda um cravo pra mim
Eu queria estar na festa, pá
Com a tua gente
E colher pessoalmente
Uma flor no teu jardim

Sei que há léguas a nos separar
Tanto mar, tanto mar
Sei, também, que é preciso, pá
Navegar, navegar
Lá faz primavera, pá
Cá estou doente
Manda urgentemente
Um cheirinho da alecrim

A versão permitida

A versão da música permitida foi lançada após 1975, ano em que um golpe militar pôs fim ao PREC (Processo Revolucionário em Curso) em Portugal. A Revolução agonizava... Era o fim de abril em Portugal...
Nessa versão, Chico muda o objetivo inicial. A música nos mostra uma espécie de conversa travada entre um português no Brasil e um português em Portugal. Com um caráter nostálgico, trata a revolução como acontecimento passado, distante, agora apenas na memória. Mostra a saudade do português de sua terra, de sua gente. Mas mesmo assim, Chico Buarque consegue deixar expresso alguma esperança nos últimos versos.
O sonho continuaria vivo...
Letra da versão permitida:

Foi bonita a festa, pá
Fiquei contente
Ainda guardo renitente
Um velho cravo para mim
Já murcharam tua festa, pá
Mas certamente
Esqueceram uma semente
Nalgum canto de jardim

Sei que há léguas a nos separar
Tanto mar, tanto mar
Sei, também, quanto é preciso, pá
Navegar, navegar
Canta primavera, pá
Cá estou carente
Manda novamente
Algum cheirinho de alecrim

Autor: Daniel Arnoni

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